Na Filizola
A mercearia de papai
era a mais sortida do bairro.
Não faltavam aviamentos,
fichas de orelhão,
chiclete Ploc, cajuína
– memórias embrulhadas
em papel de pão.
Os fiados da caderneta
não davam conta
do vasto mundo diluído
nos olhos do meu pai.
Na Filizola dos ombros,
o peso silencioso dos nascidos
pra chorar.
Minha mãe
Minha mãe costura
na Singer
todo fim de
tarde,
elegante e
sagaz
na missão de
consertar o mundo.
Como toda mãe,
sabe botar brilho
nos olhos dos filhos,
e põe na caixa de botões
os sentimentos extraviados.
Seus olhos
– de tardezinha –
são dois botões nublados.
Iara Maria Carvalho
(Do novo livro em lançamento: Meia Porção de Sol)