POESIA DE AÇUCAREIRO

Amador Ribeiro Neto

 

Ana Martins Marques (Belo Horizonte, 1977) é mestre em Literatura Brasileira pela UFMG. Foi contemplada duas vezes com o Prêmio Cidade de Belo Horizonte de Literatura. A vida submarina (2009) reúne os poemas premiados.  Com Da arte das armadilhas (S. Paulo: Companhia das Letras, 2011) recebe o Prêmio Alphonsus de Guimaraens, da Fundação Biblioteca Nacional.

As orelhas de seu mais recente livro são assinadas por Armando Freitas Filho, um nome respeitado por considerável número de críticos e leitores. Ele diz que leu os livros da poetisa num fôlego só, “de fio a pavio”. E acrescenta: “Não dá pra largar ou intercalar”.

O autor das orelhas mente. Esta poesia é um enfado.  A vida submarina nos oferece no máximo três poemas razoáveis, num volume de mais de 140 páginas. Ana Martins Marques peca pelo óbvio: nada tem a dizer e nem ao menos conhece a linguagem para dizer nada. Enfim: exaure. Dá nos nervos.

Considere, leitor, “Batata quente”: “Se eu te entregasse agora o meu amor / aceso como ele está, / como ele está, pesado, / você o trocaria rapidamente de mão, / você o guardaria um pouco na esquerda, / um pouco na direita, / por quanto tempo antes de o passar adiante?”. “Batatinha quando nasce” tem mais ritmo, imagens e ideias.

Agora veja “Reparos”: “Algumas coisas / quando se quebram / são fáceis de consertar: / uma xícara lascada / uma estatueta de gesso / um sapato velho / uma receita que desanda / ou uma  amizade arruinada. / Ainda que guardem / as marcas do remendo, / é possível que essas marcas / tenham  um certo charme / como algumas cicatrizes. / Mas experimente consertar / um poema que estragou”. Eis um poema de autoexorcismo, sem dúvida. A poetisa deveria ler o que escreve. E jamais publicar o que escreve. Já que nasce estragado.

O aborrecimento prossegue em Da arte das armadilhas. O lugar comum mais o prosaísmo e o coloquialismo insossos são a tônica ao livro. Se um concurso pode ter jurados bestiais, como entender os critérios de edição e seleção de uma prestigiosa editora como a Companhia das Letras ao publicar este miserabilíssimo volume?

Abre-se o livro e a poetisa Ana Martins Marques vem com o “Açucareiro”: “De amargo / basta / o amor // Agridoce, / ela disse // Mas a mim / pareceu / amargo”. Falta de expressividade quase absoluta. Estou pasmo. Trocadilho rude. Três estrofes competindo entre si: qual delas esgota mais rapidamente a paciência do leitor? Por ser o poema que abre o livro, não deixa de ser emblemático, não é mesmo, leitor?

Mas ele não está só. Encontra companhia em “Capacho”, que cito, tal como os anteriores, inteiramente: “Home / sweet / rua”. Pronto. É só isso o poema: um trocadilho de capacho. Outro: “Cinema”: “Encontramos na rua / uma fileira de cadeiras / de um velho cinema / levamos para casa / colocamos na varanda / passamos toda a tarde / bebendo e fumando / assistindo passar / um dia qualquer”. Nada mais nada igual a zero.

Veja agora o que ela diz em “Teatro”: “Certa noite / você me disse / que eu não tinha / coração // Nessa noite / aberta / como uma estranha flor / expus a todos / meu coração / que não tenho”. O leitor queria mais? A poetisa premiada não tem mais nada a oferecer.

Publicado pelo jornal CONTRAPONTO, João Pessoa-PB. Caderno B, coluna Augusta Poesia, dia 05.12.2014, p. B-7.

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